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Projectar o nosso Património | Quintas em Portugal

O nosso património arquitetónico é único, estende-se por todo o nosso território geográfico e manifesta-se nas mais diversas formas. A arquitectura cataloga-se conforme o seu tipo de uso. Hoje gostaria de dar enfoque às Quintas e Herdades. Começámos já com dois termos diferentes. O termo quinta é muito usado nas propriedades com exploração agrícola a Norte do Tejo, as Herdades surgem no mesmo contexto, mas na região do Ribatejo a Sul do Tejo e Alentejo e recuperam a sua denominação de quinta na zona do Algarve.


Portas de quintas, quintas em Portugal

A grande diferença entre estes dois tipos de propriedade está relacionada com a sua extensão e com o tipo de culturas que exploram. As Herdades instalam-se nas regiões de latifúndio, e grande parte das suas culturas são de regadio, gozando da situação das planícies ribatejanas e alentejanas, já as quintas situações em regiões de minifúndio onde o relevo limita a sua extensão. O nosso território está marcado pela particularidade da nossa história, do nosso relevo e do nosso clima que determinam a génese de cada região e que influenciam o modus Vivendi, a apropriação do espaço e a agricultura, com uma consequência muito forte na arquitectura. Ao longo da história de existência do nosso território o mesmo foi recebendo diferentes utilizadores que foram deixando a sua marca no nosso território.


As Quintas conhecem evoluções de Norte a Sul do país desde a sua origem. Se na zona do Norte era comum as casas serem habitadas pelos seus proprietários e daí resultarem propriedades com uma arquitectura mais nobre, muitas delas com um brasão da família proprietária e com características de um solar, já na zona do Ribatejo, a norte do rio Tejo, encontramos quintas com uma arquitectura também nobre, mas mais simples quando comparada com as grandes quintas do Douro ou os Solares do Minho.




A zona onde se encontram casas de quintas mais nobres coincide com a zona do Douro. São imponentes solares com mais do que um andar, geralmente eram sobre-elevados para que o piso de habitação não estivesse em contacto com o solo, fugindo da humidade e possíveis inundações, evitando problemas para a saúde e todas as patologias construtivas associadas. O Piso 0 era geralmente aproveitado para zonas de apoio e armazenamento. Era comum as propriedades de maiores dimensões e importância terem uma capela onde o prior se deslocava para celebrar missa para a família e funcionários. Muitas destas quintas passaram para particulares após a inquisição, pois muitos destes solares derivam de antigos conventos ou casas de frades/freiras, que ali tinham a sua residência acompanhada de uma zona agrícola, onde cultivavam o que consumiam: hortícolas, vinha e arvores de fruto.


Quintas em Portugal by Salvador Morais

É por isso comum encontrar muitas destas quintas com capelas. O piso 1 era o piso mais nobre. Era o piso dos salões e das áreas sociais. Há dois tipos de planta mais utilizados, a primeira com a sala principal ao centro, onde se agregam um conjunto de outras salas para um dos lados, e os quartos vão preencher uma segunda ala. Ou uma zona nuclear centrar com as salas e zonas comuns que articula duas alas de quartos e um núcleo de serviço a tardoz onde a copa liga a cozinha através da casa-de-jantar.


É comum encontrar nas casas destas quintas uma sucessão de salas que se ligam entre si. Isto acontecia por dois motivos, o primeiro era social, os corredores eram locais de passagem e menos nobres. Entendia-se que os convidados deveriam passar de sala em sala sem ter que voltar ao corredor, mantendo-se sempre nos espaços mais importantes da casa. A segunda razão era funcional e dizia respeito a manutenção da temperatura ambiente. A temperatura mantinha-se mais facilmente quanto menos vezes se abrisse a porta para o corredor. Eram salões de boas dimensões, com paredes normalmente estucadas, embora na zona do Douro e por influência inglesa tenham começado a surgir para alem de outros elementos decorativos também os painéis de madeira trabalhados e o papel no revestimento de paredes. Os tectos são geralmente em madeira de caixotão ou de saia-camisa, o que dá uma grande sobriedade e dimensão ao espaço.


Em escadas, lancis, socos, cunhais e obreiras domina a pedra, que dependendo das zonas também se poderia encontrar na própria alvenaria. No Norte é comum encontrar casas com granito, mas noutras zonas surge o xisto. Quando tinham panos de alvenaria a cor branca era muito usada, mas é muito comum também encontrar edifícios com cores vivas como o amarelo e rosa velho. Nestes solares é possível disfrutar de bonitos jardins onde as zonas de sombra e os abrigos permitiam tirar partido de bonitas vistas durante os dias mais quentes.


No que toca às herdades o tipo de arquitectura utilizado é diferente. Falamos da casa típica alentejana, mais simples e humildes de um só piso, caiadas e com uma barra de cor que geralmente estava relacionada com a casa agrícola à qual pertencia. Na sua génese as herdades serviam para a exploração agrícola e tinham casas principais que serviam para utilizações pontuais do proprietário. A maioria das construções eram dos trabalhadores que ali viviam e instalavam verdadeiras cidades em miniatura, tudo funcionava como se de uma aldeia fabril se tratasse. Muitas tinham capela, onde os trabalhadores se reuniam ao Domingo, muitas vezes na presença do proprietário, e visitavam durante a semana para entregar o seu sacrifício pelo sucesso das culturas, tinham a casa do forno, com um forno a lenha onde era feito o pão e outras iguarias. As casas dos caseiros eram simples, geralmente tinham apenas duas divisões, uma zona de estar e de cozinha e uma segunda, o quarto.


Quintas em Portugal by Salvador Morais

Grande parte das casas principais não eram casas de uso diário, serviam de apoio, ou para uso sazonal e para receber em dias específicos por isso a sua génese espacial estava orientada para as zonas sociais interiores e exteriores, eram usadas pelo proprietário quando visitava a herdade era por isso comum encontrar espaços comuns muito generosos e espaços e quartos mais pequenos, situação que evoluiu ao longo dos tempos. A sala é geralmente dominada por uma lareira de grandes dimensões que serve como ponto de encontro e de convívio. Ali as pessoas se juntam, colocam os enchidos no fumeiro, se conversa ou as pessoas se aquecem. A lareira é um elemento de grande importância neste tipo de casas e a sua alma no inverno.


No verão troca-se a lareira pelos espaços exteriores e o ponto de encontro passa para os alpendres, muito característicos deste tipo de casas ou em outras zonas de sombra. O alpendre tinha uma dupla função. Estamos a falar de regiões quentes, o alpendre permitia a criação da zona de sombra no exterior e ao mesmo tempo impedia que o sol batesse diretamente na parede. No fundo o princípio dos sistemas passivos de sombreamento. Os materiais utilizados nas paredes exteriores são a alvenaria de pedra, que pela sua espessura e característica deste material ajudam no controlo térmico. As paredes interiores são geralmente em alvenaria de tijolo burro, mesmo material usado nos tectos abobadados (abobadas alentejanas, com peça de fecho).


Muitas quintas em Portugal estavam fechadas e esquecidas e viram nestes negócios o motivo para serem reabilitadas. As adegas e toda a parte agrícola regenerada para que a função de agricultura não se perca e ganhe qualidade.




Quintas em Portugal

Com o nascimento e crescimento do negócio do enoturismo muitos produtores optaram por fazer adegas novas mais adaptadas às necessidades e exigências de hoje e que são peças de arquitectura de grande qualidade. São peças arquitectónicas de grande potencial e singularidade arquitectónica que exigem uma equipa especializada na sua reabilitação, cada Quinta e cada herdade contam a sua história e a forma como o fazem é única. Intervir nestes edifícios abre a porta à recuperação do nosso património e à criação de um diálogo entre o novo e o pré-existente.


São projectos com história.


Salvador Morais | in TGP Magazine






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